Cultura digital e a (des) construção do cotidiano – Uma breve etnografia do Troll


Sob a perspectiva evolucionista, não é mais possível conceber a sociedade humana sem as facilidades que a tecnologia digital oferece. Ela oferece a oportunidade de, cada vez mais, a interação entre culturas diferentes, graças ao advento da informação full time, através da internet. Existem até teorias de que são, “…esses ‘fatos’ poderiam em breve desaparecer com a extinção de todos os ‘primitivos’” (KUPER, 1978, p. 16). Ou seja, que a Revolução Digital é, sem dúvida, um novo marco da história da humanidade e que por si só causaria mudança nas relações culturais.

Este fenômeno vai muito mais além dos monitores e celulares. Eles intereferem no cotidiano, mudando a escrita usual (por exemplo: pq, vc e siglas hoje universais, como LOL/Laughting Out Loud e os “emoticons”), e até construindo novas ideias. Seja nos fóruns de debate da internet, mais precisamente, nos sites de relacionamento, onde fora observada em uma breve pesquisa, neste ultimo mês de março de 2012 pelo autor, a dinâmica deste novo tipo de cultura. Assim, confirmando o pensamento de LARAIA (2001) onde: “ Da mesma forma que é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema.” Porém, ao passo que existe essa construção de um novo patrimônio cultural nesta entropia social, há um agente que simplesmente desconstrói o argumento de uma ideia lançada na rede, chamdo de Troll.

A palavra Troll tem origem no folclore escandinavo e se refere a uma criatura monstruosa (sendo ela enorme ou muito pequena.) mas o termo surgiu na Usenet, derivando da expressão “trolling for suckers” (lançando a isca para os trouxas), identificando e atribuíndo ao(s) causador(es) de sistemáticas desestabilizações de discussão, provocando e enfurecendo as pessoas envolvidas nelas.

Para se entender o individuo como agente deste sistema, se deve realizar, indivisivelmente, a identificação de suas motivações, que são a auto-afirmação, ideologia, fanatismo, sarcasmo, ou simplesmente ociosidade. Logo após identifica-lás, se faz, concomitantemente, a identificação de seus costumes. E aqui se faz necessária a menção da Teoria dos Campos de Bourdieu, onde se encaixa o conceito de “habitus”, que nada mais são as disposições adquiridas em um sistema, por aprendizagem implícita ou explícita que funciona como um outro sistema de esquemas geradores, produzindo estratégias que podem ser objetivamente afins aos interesses objetivos de seus autores sem terem sido expressamente concebidos para esse fim. (BOURDIEU, 1983, p. 94).

E para que o objetivo do Troll tenha sentido, é necessário que este campo funcione. Na pesquisa, foi explicitada o que assim entendeu Bourdieu (1983, p. 89), “é preciso que haja objetos de disputas e pessoas prontas para disputar o jogo, dotadas de habitus que impliquem no conhecimento e reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputas, etc.”.. Logo, ele usa das seguintes estratégias, que assim se faz a identificação deste sujeito:

• Lança uma mensagem polemica, contando com a reação em cadeia dos envolvidos (flame war) e assim some após a mensagem original (em certas ocasiões, mensagens não-veridicas) e se diverte com a repercussão em silencio. O que é chamado comumente pela Rede de “Jogar a isca e sair correndo”, daí que vem o termo original da palavra Troll.

• Induzir a baixar o nível de uma discussão, com xingamentos e baixaria, até que a outra pessoa envolvida na conversa faça o mesmo.

• Desconstruir argumentos com vocabulário apurado, referencias e expondo os outros indivíduos ao ridículo e questionando sua formação sobre o assunto.

• Repetir falácias até que leve seu adversário ao cansaço, alegando depois ter vencido a discussão após o abandono do oponente.

Quando estes ataques atingem um quociente significativo de sucesso, considerando o capital social que o troll possui na rede, acontece o que é chamado de meme. O “meme é considerado uma unidade de evolução cultural que pode de alguma forma autopropagar-se.” (DAWKINS, 2001) que pode ser “ideias” ou partes de ideias, línguas, sons, desenhos, capacidades, valores estéticos e morais, ou qualquer outra coisa que possa ser aprendida facilmente e transmitida enquanto unidade autônoma.

Como conclusão, o Troll ele é um agente tanto da construção quanto da destruição de pensamento pela rede, pois ele consegue interferir no cotidiano dentro e fora da rede. Mas para compreender essa transformação da cultura como um todo, “A solução dependia de ver o homem real em seu todo, de distinguir seus modos de pensar e seus sentimentos das declarações de normas por ele formuladas, e tudo isso do que ele realmente fazia.” (KUPER, 1978, p. 38)

Texto: Luis Rodrigues Jr

BIBLIOGRAFIA:
BOURDIEU, P; Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.
Dawkins, R. O gene egoísta. Belo Horizonte: Itatiaia, 2001.
http://entropia.blog.br/2011/04/20/nao-alimente-os-trolls/, pesquisado em 29/03/2012
http://pt.wikipedia.org/wiki/Troll_(internet), pesquisado em 29/03/2012
KUPER, A; Antropólogos e antropologias, Rio de Janeiro: F. Alves, 1978
LARAIA, R;Cultura: uni conceito antropológico / 14.ed, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001
Para Entender as Mídias Sociais, Organizadora: Ana Brambilla (e-book): 2011