O que eu assisti na segunda-feira no Gigantinho? Para onde fomos transportados? O que faremos do mundo após termos sido levados, sem aviso, ao encontro da nossa ancestralidade? Não estávamos preparados para isso, sabíamos que seria um encontro inesquecível com o Deus Dourado, a representação viva dos nossos sonhos (começo a chorar ouvindo nos fones Four Sticks) adolescentes, não se trata de sexualidade, mas também se trata de sexualidade.
Mora em Plant o Dionísio de Morrison, a Iansã de Elis, o Exú de Jagger, o krishna de George. Mora em Plant o homem ou a mulher que somos levados a ser, com paixão, entrega, doses de inconsequência, de vício, saudade e tradição. Não vai adiantar eu falar do set list, do repertório, não lamentarei por quem deixou de ir por conta de comentários de que o show não estaria tão bom por não ser o repertório total de Led Zeppelin, não lamento porque a celebração que ocorreu na segunda-feira foi para uma parcela que, ao fim de tudo, se viu iluminada. Agradeço aos caras que desde os meus 15 anos me mostraram o rock and roll.
Agradeço à alma iluminada na rede Globo que infiltrou Stairway to Heaven na trilha sonora de Top Model. Naquela época eu me tornaria o negrinho roqueiro da Gotuzzo, em plena ascensão do pagode e do sertanejo; uma época em que ao negro pobre da periferia não era muito conveniente sonhar com a universidade, com música “de branco”, com amizades duradouras e sinceras. Era simplesmente o conceito inserido na frase “Isso não é pra mim.” Dito isso informo aos terráqueos leitores de que o ROCK LIBERTA. Ter estado há alguns metros do homem que despertou em mim a vontade de (pausa para mais lágrimas em Battle of Evermore) cantar, que me ensina até hoje coisas tipo postura de palco, composição e vitalidade, foi algo cujas consequências não podem ser, de pronto, avaliadas ou mensuradas.
Plant é um músico que se reinventa a cada disco, e além de si próprio reinventa o Led Zeppelin, rearranja, reconstrói. Eu particularmente me dirigi ao show com dois descontentamentos: a troca dos integrantes da banda (já não temos mais Phil Johnstone, Charlie Jones e Chris Blackwell nomes essenciais pra mim que curti muito a fase 1988-2000) e também a ausência das músicas desse período e anteriores como In The Mood, Big Log e Ship of Fools. Afora a paixão que sintamos, ou não, pelo artista, devemos reconhecer que sua carreira solo é uma das mais bem sucedidas da história do rock. Tudo bem que os primeiros discos são exemplos do caráter brega do início dos anos 80. Segundo Vitor Ramil “Ninguém saiu ileso dos anos 80…” entretanto com a entrada dos músicos acima citados, Plant teve um ganho em qualidade e, na minha opinião, o auge dessa criatividade resgatada se dá em Fate of Nations. Mas, diferente disso, o show transitou entre o repertório do Zeppelin – claro – e das faixas do álbum Mighty Rearranger.
Eu poderia não ter gostado, já que meus anseios não foram totalmente atendidos no que se refere ao repertório, entretanto até isso depõe a favor de Plant, a constante necessidade de inovar, desafiar as convenções que ele mesmo, ao lado de Page, Jones e Bonham, inventou. O que eu, e muitos amigos, esperamos para o futuro é que nosso ídolo tenha muita saúde e mantenha a vitalidade mostrada, para que outras turnês venham para nosso estado. Quem sabe a gente reivindica uma vinda do show da reunião dos remanescentes do Led via facebook, criando um crowdfunding no site Traga Seu Show… agora que estivemos ao lado de um Deus nada nos é impossível. Axé, Salam, Amém Sir Robert Plant, nossas preces foram atendidas.
Mais informações em www.robertplant.com.
por Daniel Balhego
Músico e Turismólogo
Editor, gestor de conteúdo, fundador do ecult. Redator e pretenso escritor, autor do romance Três contra Todos. Produtor Cultural sempre que possível.