por José Antonio Magalhães
Esse dia 28, na Casa Fora do Eixo Pelotas, rolou um evento duplo de uma das bandas mais seminais do rock pelotense atual: a Canastra Suja lançou seu mais novo disco e, ao mesmo tempo, anunciou o fim da banda.
O segundo e último disco da Canastra se chama “Máquina Loucura” e chama a atenção pelo formato físico – o encarte-objeto tem formato triangular e, quando montado, assume uma forma geométrica cujo nome técnico desconheço. O conceito partiu de um objeto de autoria do guitarrista Teco Barbachan, que é artista plástico. Já a ideia de basear o formato do disco na obra do colega foi do tecladista Vini Albernaz.
UM DISCO DE TRANSIÇÃO
A Canastra Suja, nascida em 2006, fez o nome no rock pelotense como banda de (como eles mesmos chamavam) rock ‘n’ roll sem frescura. Suas raízes estavam no blues e no rock gaúcho e as letras do primeiro disco (“Três minutos pra água ferver” – 2010) partem da fórmula garotinhas-juvenis-sofrem-nas-nossas-mãos. A canção mais famosa dessa época talvez seja “Um Blues pra Você Chorar“.
Com a saída do baterista Marcelo Gafanha, a banda entrou em uma fase de instabilidade. Não se sentiam à vontade para buscar um novo baterista, então encararam o momento como um desafio à reinvenção. Vini Albernaz tinha entrado na banda como tecladista e estava experimentando com batidas eletrônicas, de modo que decidiram substituir a bateria por elas e ver no que dava.
A banda começou a desconstruir o seu próprio conceito, subvertendo em grande medida aquilo que a caracterizava. As canções, que antes nasciam de longos ensaios, passaram a ser criadas no processo de gravação, sobrepondo camadas de instrumentos às guias em voz e violão. Esse processo transcorria em madrugadas no quarto do baixista Alércio, na Casa Azul, onde morava com outros membros da banda.
O terreno que a banda estava pisando ainda era tão instável que preferiram não usar o nome “Canastra Suja” em shows dessa época. Adotaram para o que era, até então, um projeto paralelo, o nome “Vermelho Incidental”.
A nova fórmula, sem bateria, com músicas mais paradas e letras poetizadas (Alércio estreava como compositor e o guitarra/vocal Alex Vaz tinha mudado muito de estilo nas letras) desceu estranha para o público já estabelecido da banda. Muitos se sentiram alienados, não entenderam o que era aquilo – ou entenderam e não gostaram. Em um festival de rock pesado em Bagé, chegaram a ser vaiados no palco.
Com o tempo, a banda assumiu o novo conceito para o segundo disco. Chegaram a fazer shows como Canastra Suja e transformar versões de canções antigas para o novo estilo, como na apresentação que fizeram na Casa Paralela no início de 2012, onde até o visual da banda (olhos pintados, coisa e tal) era de causar estranheza nos adeptos do “rock ‘n’ roll sem frescura”.
A SEPARAÇÃO
Até porque alguns membros da banda moravam juntos, havia um sentido de família entre todos eles, que de certo modo se quebrou com a saída do Gafanha, contou Teco na Casa Fora do Eixo. Gradualmente, cada um dos membros restantes se ocupou das suas próprias coisas. Alex tinha o seu Projeto Massimiliano, Teco se enfurnou para trabalhar em projetos de arte como o objeto que veio a inspirar o encarte, Vini terminou sua graduação em Artes, Alércio ficou lendo, lendo, e começando a compor canções.
Vários fatores contribuíram para o fim da banda. Além dos focos divergentes, o dinheiro do procultura, para o qual tinha sido aprovado o novo disco, estava atrasando, e criou-se uma espécie de limbo, uma espera para divulgar um disco que não saía. Isso tudo somado a possíveis divergências pessoais dentro da banda – motivo que está longe de ser raro no mundo do rock – resulta agora no anúncio definitivo do fim.
CONVERSALHADA
Na Casa Fora do Eixo, o domingo foi tranquilo. Começou com uma conversa com os membros da banda, que contaram muito dessa história que está aqui reproduzida, expressaram sentimentos, falaram sobre o disco. Vini ainda tentou ensinar o público a montar o disco-objeto da banda – o que não deixa pela simplicidade de ser complicado. Acabada a conversa, foi o momento de escutar o disco, que foi reproduzido na íntegra para os presentes. Enquanto alguns sentavam atentos na sala onde estava o som, outros escutavam de forma mais casual entre conversas e cervejas.
No “velório da Canastra Suja” (para usar as palavras de Teco), ficamos com um demo de 2007 (“Rock ‘N’ Roll Canastra”), dois discos de estúdio (“Três Minutos pra Água Ferver” e “Máquina Loucura”), um EP (“Cozinha do Desespero” – 2011) e um “ao vivo” de 2009. Além disso, ficamos com a expectativa pelos próximos movimentos dos membros da banda. O Massimiliano, de Alex Vaz, prepara o lançamento do EP “Orleanza”. Teco andou se apresentando com seu projeto “Invaders”, que mistura música instrumental com vídeo. A Musa Híbrida, nova banda de Vini e Alércio, já tem feito sucesso com o primeiro disco, disponível para download.
Ps. Não deixem de conferir o belo texto publicado pelo Alércio no facebook da banda. Ele tem como expressar tudo isso com mais vida do que eu. O texto trata principalmente da fase mais inicial da Canastra, que não apareceu aqui.
fotos: Casa Fora do Eixo Pelotas
Editor, gestor de conteúdo, fundador do ecult. Redator e pretenso escritor, autor do romance Três contra Todos. Produtor Cultural sempre que possível.