Depois de quase 1 ano, Rodrigo Tavares, rockeiro de Camaquã criado em Pelotas, voltou à cidade com seu projeto Esteban. Na última sexta-feira, 7/12, músico e banda subiram ao palco do João Gilberto Bar com público regular, mas de interessados: familiares do Tavares que esperavam ansiosos na porta e fãs que, além de cantar em coro as mais de 10 canções apresentadas, gritavam “TOCA FITO!”.
Na ocasião, pairava sobre todos uma inquieta ansiedade para celebrar junto com o cabeça do Esteban a sua mais recente (e talvez mais emocionante) conquista de ter feito o show de abertura do seu maior ídolo, Fito Paez, na capital gaúcha.
“Ainda tô no modo comemoração, faz uma semana. Não consigo expressar o que aconteceu, a não ser agradecer a vida pela oportunidade de eu chegar tão perto de uma pessoa tão importante para mim. Eu sou agnóstico, mas posso dizer que conhecer o Fito foi o mais próximo para mim de conhecer uma entidade”- Tavares sobre seu show de abertura na turnê de Fito Paez.
Absolutamente, Tavares era o astro, a estrela da noite, o rockstar de quem todos cobiçavam a atenção. Naquela noite, ali, Tavares colhia os frutos mais positivos que um artista pode ter: admiração, carinho e reconhecimento. Dentro das paredes do João Gilberto, ele era titular sem vaias da torcida. Entretanto, como disse Fernando Pessoa, a realidade sempre é mais ou menos do que nós queremos.
Apesar da sólida carreira, das participações em shows internacionais, dos prêmios e dos milhares de ouvintes mensais, a trajetória de Rodrigo Tavares sempre dividiu opiniões, principalmente depois de sair da banda Fresno em 2012. São, principalmente, suas declarações no Twitter que lhe garantem o alvo em polêmicas e dão força a rótulos negativos, como “machista”, “talarico” e, depois das últimas eleições, “esquedopata”.
O resultado disso, cada vez mais, é exatamente o oposto do que se viu no último show em Pelotas: uma série de “ex-fãs” que o admiravam na adolescência, ainda como baixista da Fresno, e um muro que limita o interesse das pessoas em seus últimos lançamentos ao que manchetes dizem sobre ele. Um contingente, pois, de novos desinteressados e, até mesmo, haters de Tavares e, por conseguinte, do projeto Esteban.
Foi justamente a minha retrospectiva do ano no Spotify na quinta-feira, 6/12, que me levou até o camarim na sexta-feira, com entrevista agendada. Por uma série de tuites infelizes do artista, há muito eu rechaçava qualquer simpatia por sua figura, mas os algorítmos do streaming me traíram e revelaram que ainda assim Esteban estava entre os mais ouvidos. Atestei meu novo lado do muro e para isso precisei romper o limite dos rótulos de manchete e entender, sem filtro, o que ele tinha para dizer. Liguei o gravador.
Como tu defines a tua música?
Eu me encaixo na música cisplatina (Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina). Eu descobri esse ano, com retrospectiva do Spotify, que a segunda coisa que eu mais ouvi depois de Fito foi Caetano. Eu gosto muito da música brasileira, sabe?! Mas a música que eu faço é muito mais regionalizada. Não só pela gaita, mas pelo tipo de coisas que eu falo. Eu tento absorver o máximo que eu consigo desses caras da Argentina e do Uruguai, passar para português e levar estilo para o brasileiro. E meio que dá certo, porque o lugar em que eu mais tenho público hoje, com certeza, é Belém do Pará, que fica a 4 mil quilômetros de Pelotas,onde eu vivi a vida inteira.
Não posso deixar de mencionar o assunto “redes sociais”… Tu é uma figura um pouco polêmica nelas.
Isso é um problema… Eu sou ansioso. A verdade é que eu não deveria tuitar quando eu tô brabo com alguma coisa, ou nervoso e ansioso, mas quando eu chego nas redes sociais eu esqueço que eu sou eu, que não vou falar para meus amigos apenas, já que tem 300 mil pessoas me seguindo. Eu sempre falo que eu quando eu to brabo eu não dou opinião, eu falo m*rd. E o que me prejudica nas redes sociais que me irrita um pouco, embora eu esteja só no Twitter, é que elas são instrumentos muito mais de afastar do que de aproximar as pessoas. O nosso pensamento está muito binário de “ou eu amo,ou eu odeio”. Além disso, um problema do brasileiro- e tá aí o presidente eleito para provar-é o de interpretação. É muito sério, porque as pessoas descontextualizam o que tu fala e fazem parecer outra coisa. E eu já sou um alvo disso, um exemplo é o episódio de quando o jornalista Marcelo Rezende morreu.
Ele estava fazendo um tratamento que todo mundo sabia que não ia dar certo e eu lamentei que ele tinha largado a medicina e tinha morrido.Eu nenhum momento eu debochei ou zombei da morte dele. E eu fui massacrado por não ter acreditado na “última opção do cara”. Eu, se tivesse câncer, iria para um hospital e não em uma pessoa para me dar ervas. E essa reação foi um exemplo claro desse pensamento binário. O cara tinha um programa que só falava de tragédia de maneira naturalizada e quando eu comentei uma tragédia que aconteceu com ele, ele virou um anjo e eu um crápula. Um absurdo que isso fez com que veículos que nunca falaram sobre a minha música, por exemplo, publicassem meu tuite e pedisse para eu esclarecer.
E tu também já tiveste alguns tuítes interpretados com um viés machista…
A maior cagada que eu fiz na minha vida foi ter falado como paulistano num tuíte em que eu criticava a Janaína Paschoal. E eu critico ela mesmo, porque eu sou um cara totalmente contrário ao seu pensamento, acho que ela foi um desservirço para o país. E eu tuitei “Tu é uma p*ta louca”, porque em São Paulo se usa p*ta para “Muito”. Eu tava estressado, eu não deveria ter dito que ela era louca. Mas nunca, em momento algum, eu pensei eu chamá-la de p*ta. Não era isso! Mas as pessoas queriam interpretar isso. E eu larguei de mão, não fiquei me explicando muito. No fim, acabou me levando para uma rede muito pior, a do “bolsominion” que usou isso contra mim para fazer eu parecer um crápula para a esquerda. Os dois lados ficaram me odiando.
Eu pago por isso. Eu sei quanto eu pago por não conseguir ficar quieto e não ligo tanto.
Na política, principalmente, eu não consegui ficar quieto porque estávamos em uma situação em que ou elegíamos um psicopata ou o Haddad, que é professor e que eu conheço muito bem por viver há anos em São Paulo. Eu não iria ficar quieto de jeito nenhum, tendo 300 mil ou 100 seguidores. Para mim, a pior coisa nessas eleições foi quem se omitiu. Eu não vou calar boca e se as pessoas vão me odiar por isso, aí é problema delas.
E a tua música acaba sendo ofuscada por essas polêmicas?
Eu acho certo que o caráter do artista, além da obra, também seja levado em consideração. Mas acho que em muitos casos o caráter foi levado em consideradação por um cálculo sem sentido, por coisas descontextualizadas. A internet é a terra do valente, me contestam coisas lá que nunca me contestaram cara a cara.
Internacionalista, estudante de jornalismo, sentimental e especialista em Beatles. Não para quieta, caminha correndo e um dia vai fugir para o Uruguai.
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