A insustentável leveza de uma manhã de folga. A leitura dos jornais, o café coado, a torrada com manteiga derretendo, o sol. É um lance de sorte ter sol no dia de folga. Sem me amarrar em casa, vesti uma roupa, peguei um livro e desci. Caminhei com ansiedade, logo que cheguei na esquina da praça, apertei o passo. Parei na frente do prédio e olhei para o globo terrestre no topo da fachada, lembrei do Atlas que ganhei quando ainda matraqueava o tatibitate. As portas e janelas estavam abertas como se estendidas para um abraço, abraço entre velhos amigos.
Toda criança que procura ler na Biblioteca Pública é recebida com receptividade. A primeira vez em que matei aula na escola e fui até o prédio dos livros, os atendentes fizeram eu perceber que ali estaria seguro. Fui experimentando um prazer em ficar olhando os livros de estante em estante, lendo títulos, assimilando o ambiente. Passava os dedos nas lombadas em sequência para sentir as texturas. As vezes puxava um livro para dar uma folheada, e os outros na prateleira se empurravam e apertavam-se uns contra os outros. Então, com o anelar e o indicador eu separava dois livros para forçar a entrada do que estava segurando. Há algo de erótico nesse movimento.
A biblioteca ficou fechada durante meses em razão da pandemia. Nesse período, a sociedade passou definitivamente do século XX, para o século XXI, ampliou assimilação digital cotidiana, e a comunicação em papel deixou de ser necessária. Depois de entrar no prédio, eu estava sentado à escrivaninha no salão da recepção, publicando no Instagram uma foto das estantes. Percebia que a influência digital não levaria novos leitores a procurar estudar em pilhas de papel, podendo ter todos os livros num único dispositivo, e lê-los de maneira mais interativa. Foi quando um guri chegou na porta e perguntou em direção ao balcão: – já está aberto para leitura?
Texto: Lucian Brum
Arte: @x.loremipsum
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Jornalista.
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