Coletivo UmDeNós ampara população de rua com marmitas e agasalhos em Pelotas


Foto: Crislan Escalante

As manhãs de sábado têm um significado diferente para cada pessoa, de acordo com sua rotina. Para aqueles que folgam aos finais de semana, é um momento de dormir até um pouco mais tarde. Para quem trabalha, se assemelha a outros dias úteis, mas com clima de encerrar o expediente mais cedo. Para os boêmios, as primeiras horas de sábado costumam ser no “modo avião”.

Para os integrantes do coletivo UmDeNós o sábado é momento de exercer a solidariedade e levantar da cama cedo, para adiantar o almoço daqueles que mais precisam. O projeto, iniciado há quase 7 anos a partir de debates entre amigos em um grupo de Whatsapp, leva marmitas, agasalhos, calçados e álcool gel para as pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade em Pelotas.

Foto: Crislan Escalante

Todo sábado, a partir das 6h da manhã, o grupo inicia a movimentação para o preparo das refeições, na cozinha localizada na sede da Associação de Moradores da Guabiroba, bairro popular de Pelotas, localizado na macrorregião do Fragata.

As ações sociais do coletivo são desenvolvidas desde a sua fundação, e se tornam cada vez mais urgentes em 2021, ano de continuidade da pandemia, crise econômico-social no Brasil e com inverno rigoroso no extremo sul do país.

Foto: Crislan Escalante

No último sábado, dia 31 de julho, foram distribuídas 50 marmitas nas ruas da cidade, em uma ação que percorreu o entorno da Praça Coronel Pedro Osório, no centro histórico de Pelotas, e o Parque Dom Antônio Zattera, na avenida Bento Gonçalves. Calçados e agasalhos foram disponibilizados para escolha dos que chegavam até a Kombi colorida com arte do grafiteiro e tatuador Beethoven, já reconhecida por muitos dos beneficiados pelas doações.

Com a pandemia, Pelotas registrou aumento do número de pessoas em situação de rua, perceptível por quem circula pela cidade, e também nos registros dos serviços sociais oferecidos pelo poder executivo municipal. De acordo com dados da Prefeitura, 361 pessoas se encontravam em situação de rua em abril de 2021.

A estudante de Direito e integrante do UmDeNós, Alexya Lhullier, 20 anos, conta que a empatia e vontade de fazer o bem são os fatores que a motivam a participar das ações sociais do coletivo.

“Primeiramente a empatia com o próximo, porque não é só levantar da cama e vir, é saber que tem pessoas que dependem da gente, e nosso dia fica completo fazendo isso com essas pessoas, para mim é muito gratificante estar envolvida e também fazer o bem. Se todos se juntassem, o Brasil, o mundo inteiro para fazer o bem, esse seria o modo da gente andar para frente e progredir”, reflete Alexya.

Foto: Crislan Escalante

Visão de rua

Além da doação de comida e agasalhos, a UmDeNós doa tempo e atenção às pessoas atendidas pelo projeto. Toda a semana surgem rostos novos, mas há também os que se repetem a cada sábado, e desenvolvem laços de confiança e amizade com os integrantes do coletivo.

A história do cabeleireiro Rafael, por exemplo, repercutiu nas redes sociais, após o rapaz aceitar dar um depoimento em vídeo, postado na página do Facebook da UmDeNós. Na entrevista, o morador conta que se mudou da região da Serra Gaúcha para Pelotas após conseguir uma oportunidade de emprego em um salão de cabeleireiro. Durante a pandemia o salão teve que fechar as portas devido à diminuição de clientes, e Rafael acabou desempregado e obrigado a dormir nas ruas, onde teve seus documentos e pertences furtados.

Divulgar o bem

“Com a repercussão do vídeo muita gente de Pelotas entrou em contato com o coletivo, na intenção de contribuir com nossas ações, e também ajudar diretamente o Rafael. Ele tem um cachorro, que é o companheiro dele nas ruas, e teve pessoal que entrou em contato para doar uma casinha para o cachorro, gente que se disponibilizou a pagar a passagem do Rafael de volta para a Serra, uma corrente do bem mesmo”, conta Thiago Moura, 39 anos, conhecido como “Gagui”, integrante do coletivo UmDeNós.

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Na visão do grupo, quanto mais o trabalho é divulgado, mais pessoas chegam para contribuir com as ações, seja em forma de doação de alimentos ou roupas, ou até mesmo se tornando mais um voluntário.

“No momento que as pessoas veem uma foto ou vídeo que a gente posta nas redes sociais isso motiva elas, pois muita gente tem algo para contribuir e desejo de ajudar, mas não sabe por onde começar. Nosso objetivo não é a autopromoção pessoal, é aumentar a capacidade de ajudar quem mais precisa, a galera que tá na rua”, reforça Gagui.

Trajetória

Foto: Crislan Escalante

O coletivo UmDeNós surge em meados de 2014,  a partir da junção de alguns amigos com interesses em comum, como o envolvimento com a cultura Hip Hop e a vontade de fazer a diferença dentro das comunidades de Pelotas.

As primeiras reuniões que deram origem ao coletivo aconteciam no estúdio do tatuador Beethoven – o mesmo que fez a arte na Kombi usada para a distribuição das marmitas. Nessa mesma época foi criado um grupo no Whatsapp para discutir as ações que seriam desenvolvidas. Esse mesmo grupo existe até hoje para organização interna, além de uma página no Facebook e um perfil no Instagram, com objetivo de divulgar as ações e debater temas como a desigualdade social, o preconceito racial e busca de soluções para os problemas sociais do país.

De fundador do coletivo a colaborador discreto

O vereador Cesar Brizolara, o “Cesinha”, é um dos fundadores do coletivo UmDeNós, e por muitos anos tomou frente no processo junto aos demais participantes. Atualmente, apesar de acompanhar de perto o trabalho do coletivo, prefere a discrição, e adotou como regra não aparecer na linha de frente, principalmente nas ações de rua.

Paralelo à ação no UmDeNós, Cesinha trilhou sua carreira na política partidária, com uma campanha para vereador ainda no ano de 2016, na qual obteve votação expressiva de 1.930 votos, mas que não foram suficientes para garantir uma vaga na Câmara Municipal de Pelotas.

Em 2020, no entanto, a história foi diferente. Cesinha se elegeu vereador com 1.957 votos, em uma eleição disputada por grande número de candidatos e com campanhas de rua restritas por conta da pandemia do coronavírus.

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A exposição consequente de sua vida pública fez com que ele optasse pela retirada de campo nas ações do UmDeNós, já que o coletivo, como o próprio nome diz, não pode ter um dono, e resulta de decisões de todos que participam. Para evitar a imagem de “um projeto do vereador tal”, Cesinha preferiu adotar essa nova postura.

“Eu não poderia puxar um protagonismo somente pra mim, não seria justo com os meus companheiros do coletivo que construíram essa história. Não acredito em ação individual, naquele indivíduo que muda uma realidade inteira sozinho. Todo mundo precisa de ajuda, precisa de um grupo maior, de um coletivo. O UmDeNós não é do Césinha, é de todos que fizeram e fazem dele uma realidade, uma história que vem muito antes do meu mandato, e que existe independente dele. Mas é claro que não posso apagar minha história, faço parte do UmDeNós e me orgulho muito disso”, explicou Cesinha.

Como colaborar com o coletivo UmDeNós?

O coletivo UmDeNós aceita doações de alimentos para a distribuição das marmitas, agasalhos, calçados, cobertores, travesseiros, assim como colaboração em dinheiro para a aquisição de alimentos. Quem tiver interesse em colaborar pode entrar em contato pelas redes sociais do projeto.

Instagram coletivo_umdenos: www.instagram.com/coletivo_umdenos

Facebook: www.facebook.com/UmdenosOficial

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Texto: Paulo Ienczak

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