Abri a janela, olhei para rua, tudo era umidade. As cores dos prédios perdiam vibração em meio à atmosfera branca. No nevoeiro, se via apenas alguns contornos, o frio geometrizava a cidade. Nos dias sem sol do mês de julho, é o período de frutificação de fungos. Eles se formam nas paredes, atrás de espelhos, no fundo de guarda-roupas e, se deixarmos de aquecer o coração, podem grudar na alma.
Nessas primeiras horas da manhã, sem motivo para sair de casa, levantei pé por pé e fui preparar café da manhã. Esperando o leite ferver, lia um soneto encostado na parede, com dois cacetinhos tresnoitados na torradeira. A bandeja aqui de casa é uma tábua rústica, as xícaras não são iguais, mas sirvo para ela com carinho nosso acepipe. A felicidade, se forma ao ver abrir seus olhos remelados junto a um sorriso brilhante, quando lhe saúdo – bom dia, meu amor.
O inverno contribui para a aproximação, uma sincera troca de abraço é como sentar frente a lareira. E precisamos de todo tipo de calor, as roupas para lavar se acumulam, as toalhas de banho não secam, a chuva cai fininha, devagar, como se estivesse querendo permanecer por mais tempo. Tudo conspira para o convívio embaixo dos cobertores.
Mesmo assim, verifico se há alguma demanda no grupo de WhatsApp do trabalho, no aplicativo do jornal, leio apenas os títulos, ainda é cedo para ficar grudado no celular. Lembro de nutrir a avenca com o sangue menstrual diluído em água. Na área de serviço, decido olhar mais uma vez para rua, Pelotas continua numa erupção de umidade e cerração.
246lucian@bol.com.br
***
Jornalista.
Faça um comentário