Queimando o Filme!


“Mais uma colaboração de nossos leitores hiperativos, que não deixam escorrer pelos seu cérebros uma boa história.”
Isis Araújo – Coordenadora e-Cult

queimando-o-filmeEssa semana me enchi de razão. Ricardo Silvestrin está me seguindo no Twitter. Oba! Escritor e comentarista consagrado sabendo que existo? Que beleza! E se existo vou ter que pensar agora. Visita importante dá trabalho pra gente. Corri a dar uma arrumada na casa – textinho novo no blog, terminar um dos 3 ou 4 livros que estou escrevendo. Vá que perguntasse sobre minha produção atual? Porque os escritores sempre querem saber dos projetos que nós iniciantes temos. Acho que é pra colocar respeito, autoridade, sei lá! E temos que mostrar serviço. Que produzimos muito. Mas hoje vi que ele segue mais de mil tweeteiros, o que muito desvalorizou minha estrela na calçada virtual. De qualquer modo, estou lá, junto com celebridades e tantos outros desconhecidos que o autor escolheu. E receberá minhas abobrinhas também. Esse texto, por exemplo comecei lá mesmo, no Twitter. O Carpinejar já fez isso, eu sei. Transformou suas postagens em livro. Genial! Imitador de Elvis também é artista? Quem sabe? Na sequência, pensei com cerca de 140 caracteres que talvez ele (o Silvestrin) lesse o que eu escrevia exatamente naquele momento. E com um pouco de sorte não iria responder, nem comentar meus tweets. Pois quem reza não espera resposta divina. Não em voz alta. Que horror! É monólogo de esperanças em quarto fechado. Afinal não fui lá pra jogar conversa fora. Quem começa a escrever acha que é escritor e que logo será lido. Quer fazer público e busca a aceitação de seus pares. Daí que todo iniciante é chato: “ó, Scliar, eu aqui ó, num pé só.” Ou, “Carpinejar, hein, hein, olha, olha, de cabeça pra baixo.” Ou ainda mesmo “Silvestrin, iuhuuuuu, sem as mãos.” Iniciante tem essa necessidade de aparecer. Teclando certa vez com o Leonardo Brasiliense, ele me disse que não existe autor iniciante e sim autor inédito. Tem sentido. Na real pra mim fica até difícil querer aparecer muito porque sou tímido. Não. Tímido é o Veríssimo. Eu sou xucro e desajeitado. E por que escrever? No meu caso é o que o ajuda a (sobre) viver. É egoísmo sim. Pleno e consciente. Eu escrevo pra não endoidar. Pra me tratar. Repito. Escrevo pra me tratar. É doença. Desde criança, pelo menos, que tenho isso. A primeira vez que se manifestou eu tinha oito anos. Minha mãe me pegou no quarto montando um livro com sumário e capa dura. Vai brincar na rua, guri! A vó intercedeu e ajudou a grampear o volume com o batedor de bifes. Voltemos à cena internética… e não foi que entrou uma postagem do Silvestrin? Abre aspas: “como disse a poeta Eunice Arruda: todo escritor, quando inicia um texto, é iniciante.” Coincidência ou não repassei a mensagem do poeta para meus seguidores. Quem conhece o Twitter sabe do que estou falando, é o chamado retweet. Mas é meio assustador esse Twitter. Podemos até dar boa noite ao William Bonner depois do Jornal Nacional. Minha avó ia adorar. Uma coisa tenho que ressaltar, até pra não queimar o filme: se escrevo pra me tratar, o diagnóstico nada tem de sublimação, viu? Arte é arte. Charuto é charuto. Mãe é mãe e Deus não lembra nem um pouco meu pai, que sempre foi bom. O objetivo é aparecer e pronto. Sem esquecer da advertência de Nietzsche, em Ecce Homo, para termos cuidado com quem se promove demais. Mas queremos sempre nossos 15 minutos de postagem, com ou sem fama.

Em “Os contistas”, Moacyr Scliar coloca que “Todos nós tivemos pai e mãe, todos nós tivemos infância, fomos traumatizados, tivemos nossos casos. Por que encher o saco de todo mundo com nossos contos? Já não chegam as preocupações cotidianas da vida, os impostos, as despesas?” Este conto é totalmente metaliterário, inclusive com verdadeiros minicontos no seu interior, como este: “Trinta contistas fizeram um pacto: até o fim da vida leriam os contos uns dos outros.” Hehehe. Bem nessas.

Tem uma música dos Beatles (ok, é cantada pelo Ringo e meio countryzinha) que diz o seguinte: “They’re gonna put me in the movies. They’re gonna make a big star out of me. We’ll make a film about a man that’s sad and lonely. And all I gotta do is act naturally.” Gostei da ideia. Que? Pra que colocar citações em inglês? Pra aparecer, é claro! Ficariam melhores em francês? Deixa eu ver, só tenho o “Petit Prince” à mão aqui, acho que serve: “La seconde planète était habitée par um vaniteux: ‘Ah! Ah! Voilà la visite d’un admirateur!” Lindo! Bravo! Para um vaidoso todos os outros são seus admiradores.

Eu vou me tratar e se um dia me fizerem um filme, ao menos que eu seja eu mesmo.


Márcio Ezequiel
– Natural de Porto Alegre, mudou-se há pouco tempo para Pelotas. Historiador e escritor. Mestre em História pela UFRGS. Estudou a Literatura de Viajantes no RS no século XIX.  Participou de Antologias organizadas por Charles Kiefer e Caio Ritter. Teve contos premiados nos Concurso “Histórias do Trabalho” da Prefeitura de Porto Alegre, no Concurso “Mário Quintana” (SINTRAJUFE/RS). Em 2007, publicou o livro: “Alfândega de Porto Alegre: 200 anos de História.”
Atualmente se aventura na crônica, postando (ou apostando) no seu Blog:  http://marcioezequiel.blogspot.com