Frisson: Sombras à espreita


Foto: Divulgação

Por Gabriel Paixão

Na noite de encerramento da Frisson, foram exibidos quatro curtas metragens de alunos do curso de Cinema e Audiovisual da UFPel, antes dos longas A Misteriosa Morte de Pérola, de Guto Parente e Ticiana Augusto Lima, e Branco Sai, Preto Fica, de Adirley Queirós. O clima de horror que permeia os curtas de abertura, além de questões relacionadas aos dispositivos de captura das imagens exibidas (câmera digital/VHS/analógica/polaroid), dialogam com peculiaridades estéticas e o próprio tom da …Morte de Pérola, aquecendo a plateia para recebê-lo com todo seu suspense paranoico e claustrofóbico.

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Os curtas Em Quadro, de Camila Albrecht, e Cianose, de Mateus Strelow, foram realizados na premissa de usar somente fotografias das cenas, stills, e não imagens em movimento. Em quadro retrata Valêncio (Vitor Azubel), um senhor que folheia saudosista por seu álbum de fotografias até se deparar com um ser sinistro (Fabiano da Silveira) ganhando vida nas páginas. Este ser volta-se para ele e o fotografa em êxtase, prendendo-o de forma surreal em suas molduras. Parece metalinguístico o desejo do antagonista de apreender o momento não como registro, mas como captura literal do real, por e para si próprio. O sujeito é aprisionado pelo olhar do outro e só o outro pode decifrá-lo.

Cianose é um sinal ou sintoma caracterizado pela tonalidade azul-arroxeada da pele, frequentemente associada a casos de asfixia. Escuta-se um policial (Pedro Júnior) comentando uma exibição de fotos relacionada à morte de Milena (Marina Koperek). No decorrer da observação, notam-se elementos sinistros nas imagens e logo eles se revelam sobrenaturais. Assim como no Em Quadro, a linha entre registro e apreensão é rompida, uma vez que há um ser vivendo e transitando entre as imagens, potente e perene nesse universo estático. Evoca-se a crença popular de que a fotografia aprisionaria o espírito do fotografado.

Dança Prosaica, de Mateus Neiss e Marcos Haas, acompanha três amigas (Carolina Sanchi, Amanda Cordeiro e Juliana Coelho) se preparando para uma festa. Elas travam diálogos ácidos e impacientes até chegarem no evento onde vivem um clímax violento, pop e fetichista. Notam-se várias referências à cultura gay em gírias, elementos cênicos icônicos e na trilha sonora dançante que embala um derramamento de sangue erotizado sob luzes artificiais duras e quentes. A estética videoclipe legitima a fantasia distorcida, valendo-se de slow motion e olhares diretos e sensuais das personagens para quem as assiste. O curta se desenrola num quadro mais fechado, recortado em 4:3, até a virada na trama, quando se abre para widescreen. Nas palavras descontraídas de Marcos antes da sessão: “É como a gente se sente chegando na balada: dando close em widescreen.”

Essa estética videoclipe deformada também compõe o clímax do curta mais longo da noite, Nua por Dentro do Couro, de Lucas Sá. O filme trata de uma hostilidade latente nas relações humanas, de violência e desejo em conflito, de algo que espreita e se esconde, mas pulsa a olho nu: sejam desafetos entre colegas de apartamento ou entre a síndica (destaque para a aparição memorável de Dagma Colomby) e seus vizinhos, ou entre uma mulher e os demônios que alimenta. Uma das duas protagonistas, interpretada de forma hipnótica pela célebre Gilda Nomacce, está preparando bolinhos. A mise-en-scène de suas ações, mesmo quando banais, é sempre tensa em expectativa num prenúncio constante do obscuro que a motiva. Em contraponto a essa figura sinistra, estão as amigas vividas por Mirã Possani, Lia Gonçalves de Azevedo e Taís Galindo, que dividem um apartamento às voltas com vaidades rotineiras. Quando Gilda e Miriã se encontram, a tragédia está anunciada. Trata-se de uma narrativa agônica e sensual com camadas de sangue e muco escorrendo entre as paredes.

Além de temáticas mórbidas e recursos estéticos recorrentes entre os curtas comentados, notam-se nos seus créditos finais diversos nomes em comum, sinal de uma teia cinematográfica universitária sendo fiada em Pelotas.

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