Lua de Ismália – O experimento que deu certo


Gustavo Cunha no João Gilberto Bar. Foto: Júlia de Andrade

por Júlia de Andrade

Alphonsus de Guimaraens criou asas para que sua personagem, Ismália, pudesse voar. A banda Lua de Ismália tem aspirações semelhantes: sair do chão para experimentar o novo. Ela é uma espécie de combinação entre a energia de um corpo jovem potencializada para mudanças que também conta com a experiência técnica do mundo musical. Prestes a completar um ano de formação – o aniversário é no próximo mês -, o projeto vem crescendo de acordo com o envolvimento do trio que o compõe.

Rennã Fedrigo no João Gilberto Bar. Foto: Júlia de Andrade

Os gaúchos Gustavo Cunha, Gustavo Silveira e o catarinense Rennã Fedrigo se conheceram no curso de composição musical da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) no mesmo ano em que decidiram organizar um projeto musical experimental que iria percorrer quilômetros além de Pelotas. “Eu e o Cunha combinamos de nos encontrar e fazer música, tentar fazer canção. O Silveira tinha acabado de voltar de um intercâmbio nos Estados Unidos e também se interessou pela ideia. Nos juntamos para fazer música sem muita pretensão e o processo foi acontecendo naturalmente, o mesmo processo que deu início à gravação do disco que estamos produzindo hoje”, explica Rennã.

Gustavo Cunha no João Gilberto Bar. Foto: Júlia de Andrade

As primeiras apresentações começaram no início deste ano. O trio tocou no Museu da Baronesa, no dia 23 de maio, pelo Música no Museu, projeto promovido pela Secult (Secretaria Municipal de Cultura) e que incentiva a cena musical local com apresentações nesse espaço aos sábados. Em junho, participaram do Festival Seiva da Terra (Rio Grande) e ganharam o troféu de melhor arranjo pela música Hermética. “A diferença de um festival para um show é que nos festivais subimos no palco, tocamos uma música e vamos embora. No show isso muda, pois temos o conceito do disco aliado a nossa apresentação”, comenta Gustavo Cunha.

No dia 12 de agosto, a Lua fez um ensaio aberto em casa e contou com um público seleto: os amigos mais chegados. Os sofás e a literal proximidade física com a música tornaram o ambiente aconchegante e intimista. “Ainda estamos descobrindo qual é o nosso público e isso tem relação com o show que fizemos em casa. Os amigos e os amigos dos amigos que foram estavam lá para nos ver, nos ouvir tocar. Em um festival a competição torna as coisas diferentes”, afirma Gustavo Silveira.

Poucos dias depois de abrirem as portas de casa, eles deram um pulo até Ponta Grossa (Paraná) para participar do 28˚ FUC (Festival Universitário da Canção), para apresentar Tempo e Espaço. Segundo Gustavo Silveira, a participação no festival não foi exatamente o que eles esperavam. “Nunca tínhamos tocado em um festival de MPB, não conhecíamos o funcionamento de um festival como esse e achamos que a nossa proposta poderia se encaixar. Acabamos percebendo que os festivais ainda são muito bitolados, a organização deles parece ainda querer os mesmos artistas dos festivais dos anos 80”. O último feito do trio foi um show na cidade, no João Gilberto Bar, em meados de agosto.

Uma das peculiaridades que acompanham a Lua é a habilidade de fazer com que o público barulhento de um bar fique em silêncio, movimentando cabeças e pés no ritmo de uma música sossegada, como Hermética, cantada baixinho.

Gustavo Silveira no João Gilberto Bar. Foto: Júlia de Andrade

Aliando arranjos vocais com violão, guitarra, violino, piano elétrico, sintetizadores e percussões alternativas, a Lua se destaca pelo experimentalismo que emprega nas suas composições autorais. O instrumento de cada um é fixo e isso começa a ser definido durante a composição e arranjo das músicas. “Compor é uma necessidade básica do compositor, um ofício necessário para manter a sua sanidade. Dessa necessidade inerente do ser criativo cresce uma agonia, a de ver suas crias sendo engavetadas, dia após dia. O compositor é tão egocêntrico que acha que o mundo precisa ouvir o que ele tem a dizer, ao ponto de dedicar uma vida a isso”, esclarece Gustavo Silveira.

Os próximos passos estão concentrados na finalização do disco que tem lançamento previsto para o final desse ano. De acordo com o Rennã, eles não têm outros shows programados para os próximos meses. “Estamos trabalhando na gravação, mixagem, masterização, arte e prensagem do disco em parceria com A Vapor Estúdio.

A ideia é fazermos um show de lançamento, com um live session que foi gravado no A Vapor e compor coisas novas. Também estamos pensando em trabalhar em um clipe”.

Os três desconhecidos que encontraram uma familiaridade na composição veem a Lua de Ismália como uma forma materializar seus anseios artísticos. Essa união possibilitou que eles pudessem estar em processos criativos diferentes, mas que se complementam musicalmente, profissionalmente e pessoalmente. A Lua é o nós dissemos, um experimento que deu certo. “Todo o processo nos traz a liberdade de experimentar diferentes ideias e com isso descobrir outras formas de fazer o que estamos produzindo, sempre procurando chegar a resultados diferentes, nos levando a resultados que talvez não conseguíssemos sozinhos. Falo do trabalho criativo em grupo, que está sendo para mim também um aprendizado”, ratifica Gustavo Cunha.

A Lua de Ismália em ensaio aberto em casa. Foto: Júlia de Andrade