Primeiro a Diversão


No dia 1º de maio fui, assim como outras centenas de pessoas, ao Theatro Guarany assistir o stand up commedy “Primeiro as Damas”. Não tinha muitas informações a respeito, a não ser que o personagem “Jorge da borracharia”, que integrava o espetáculo, estava bombando no youtube. Confesso que fui sem grandes expectativas. Para mim está mais que comprovado que ser famoso na TV ou na net não é garantia de qualidade. Fui sem esperar muito. Saí de lá com o estômago doendo e o rosto banhado em lágrimas… De tanto rir!

Riso fácil, sim, estereótipos, palavrões, piadas simples (algumas “bem batidas”) sem grandes mensagens ou lições de moral – quem disse que o teatro precisa necessária e invariavelmente ter? Se há uma coisa que me incomoda são os rótulos e as ideias preconcebidas – e preconceituosas – do que “é ou não teatro”. No meu ponto de vista, existem infindáveis maneiras de se fazer teatro – ainda bem! Caso contrário seria aborrecidíssimo… Enfim, cada um a sua maneira, os jovens atores Cris Pereira e Lucas Krug, com excelente noção de timming de comédia, cativaram o público e conseguiram manter sua atenção em tempo integral – tarefa nada fácil de conseguir, nem mesmo para comediantes “consagrados”, que costumam lotar nossos teatros e apresentar praticamente o mesmo repertório, com alguma variação.

Dirigido por Eduardo Holmes, que também produziu o espetáculo, “Primeiro as Damas” é um stand up um pouco diferente. Mais do que contar piadas, os atores compuseram personagens para os seis monólogos, de pouco mais de dez minutos cada, apresentados de forma intercalada – as apresentações começaram em Novo Hamburgo, terra natal dos atores, há mais de dois anos, com um esquete que foi crescendo, até formar um espetáculo de cerca de uma hora e meia de duração.

Lucas Krug ficou absolutamente irreconhecível em cada um dos três personagens interpretados: o adolescente “Nerd Frederico”, o idoso ranzinza e desbocado “Seu Cucar” e o “Gaudério Fagundes” (sátira de alguém bastante conhecido nosso). Além do figurino e maquilagem que conseguiam ocultar a beleza natural do ator, Lucas Krug compôs os personagens nos mínimos detalhes: criou voz, postura, trejeitos, cacoetes. E os manteve do início ao fim de cada performance.

Cris Pereira, por outro lado, não se empenhou em uma transformação completa, mas nem por isso foi menos eficaz. Começou dando vida ao vaidosíssimo locutor de rádio “Rodsom dos Anjos”. Com uma peruca loura ridícula e dentes postiços, envolveu e divertiu a plateia desde o primeiro monólogo. Mas foi com o interneticamente famoso “Jorge da borracharia” – cujo estabelecimento, aliás, ficava “logo ali no Dunas” – que levou os espectadores às gargalhadas. Algo que tornou a acontecer com seu terceiro personagem, “Claudiovaldo Nogueira, diretor artístico e produtor executivo de artistas de rua e flanelinhas”, ainda que praticamente se diferenciasse do outro apenas pela touca que levava na cabeça – “Jorge” usava um boné. O recurso de adaptar as histórias e mencionar lugares e pessoas locais, embora não seja uma novidade, atingiu o objetivo de romper barreiras e dar à plateia a sensação de proximidade, por identificação, o que acaba por arrancar ainda mais risadas.

Em cartaz há mais de dois anos, percebe-se que os atores estão seguros, à vontade, e que o trabalho foi lapidado, está maduro e cumpre perfeitamente com a proposta: diversão em primeiro lugar. E por que não? Quem foi ao Guarany esperando dar boas risadas, não saiu frustrado. Lavei a alma de tanto rir, valeu cada centavo do ingresso. Sem querer ser bairrista, o espetáculo comprova, mais uma vez, que temos muitos talentos no nosso Estado e que nem tudo o que vem “de fora” (leia-se: “grandes centros, tais como São Paulo e Rio de Janeiro) é necessariamente melhor.

“Primeiro as Damas” será reapresentado no Theatro Guarany no dia 26 de agosto.

Joice Lima – DRT atriz 013051 (Sated/SP)
Integrante do CCETP