X: o racismo em discussão na Galeria Ecarta em Porto Alegre


Foto: Poder, de Carlos Vergara. Imagem extraída da famosa série de registros do Carnaval carioca que Vergara realizou entre 1972-1976 com blocos que desfilavam no centro do Rio, entre eles, o Cacique de Ramos.

A Galeria Ecarta inaugura, no dia 19 de setembro, a mostra X, com obras de Carlos Vergara, Moisés Patrício e Rafael RG. A proposta aborda uma das questões mais contundentes que a sociedade brasileira precisa enfrentar para se desenvolver de forma justa e digna: o racismo direcionado aos negros.

Foto: Poder, de Carlos Vergara. Imagem extraída da famosa série de registros do Carnaval carioca que Vergara realizou entre 1972-1976 com blocos que desfilavam no centro do Rio, entre eles, o Cacique de Ramos.

Em um contexto de “racismo estrutural e institucionalizado” ‒ conforme a definição da ONU em relatório de 2014 sobre a discriminação racial no país ‒, X apresenta-se como uma resposta à onda conservadora que toma conta do debate público nacional. Além disso, busca estabelecer um espaço de reflexão crítica sobre o problema, tomando como eixo central para o seu combate um diálogo com as reflexões e expressões desenvolvidas pelo povo negro. Essa interlocução observa os lugares de fala dos envolvidos como forma de perceber problemas e privilégios presentes no racismo estrutural e institucionalizado. A curadoria é assinada em dupla por Luisa Duarte, crítica de arte, e Leo Felipe, diretor artístico da Galeria Ecarta.

Biblioteca temática e rodas de conversa
A mostra X contará também com uma biblioteca temática, formada por uma fortuna crítica literária sobre racismo direcionado aos negros. Durante o período da mostra, estarão disponíveis para consultas trabalhos de referência sobre escravidão, racismo, colonialismo e cultura afro-brasileira. Entre os autores e pensadores, nomes como Franz Fanon, Nei Lopes, Chimamanda Ngozi Adichie, Kabengele Munanga, Carolina de Jesus, Reginaldo Prandi e Oliveira Silveira.

A programação inclui ainda as Rodas de Conversa com grupos de ativistas, artistas e pesquisadores. Esses encontros visam tornar públicas as recentes discussões sobre as implicações históricas, políticas e sociais do racismo, bem como as formas de combatê-lo, um debate geralmente restrito às esferas da Academia ou da militância política. A coordenação é de Fernanda Oliveira, doutoranda em História e responsável pela consultoria na elaboração do referencial bibliográfico da exposição,

“Compreender o racismo exige a problematização da branquidade, a qual sustenta a consciência dos sujeitos que compõem a sociedade e, por vezes, mesmo que inconscientemente, se beneficiam de privilégios que corroboram com a manutenção da ideia de raça e, consequentemente, do racismo. A luta contra o racismo necessariamente passa pela problematização dos privilégios da branquidade”, aponta Fernanda.

Visita guiada aos Territórios Negros de Porto Alegre
Integrando a programação de X, no sábado, dia 19 de setembro, às 14h, o ônibus do projeto Territórios Negros realizará o seu roteiro por áreas ligadas à cultura e à história dos afro-brasileiros em Porto Alegre. Com a presença dos curadores da mostra, a atividade é restrita a convidados.

“O X é o fator indeterminado, a incógnita que precisamos solucionar para seguirmos adiante como sociedade. O X do ativista Malcolm, marcado para morrer como muito jovens negros nesse país. O X da encruzilhada, o espaço mágico da religiosidade afro. A Galeria Ecarta fica em frente aos Campos da Redenção, local que há 80 anos teve seu nome branqueado para Parque Farroupilha.

Há uma rica história construída pelos negros em nossa cidade que muita gente desconhece”, considera Leo Felipe.

A exposição X fica em cartaz na Galeria Ecarta até 15 de novembro. A visitação pode ser feita de terça a sexta, das 10h às 19h; sábado, das 10h às 20h; e domingo, das 10h às 18h. Informações pelo telefone 51 4009.2971. A entrada é franca.

Exposição “X”
Com obras de com obras de Carlos Vergara, Moisés Patrício e Rafael RG
Curadoria: Leo Felipe e Luisa Duarte
Onde: Galeria Ecarta (Av. João Pessoa, 943, Porto Alegre)
Abertura: 19 de setembro, sábado, às 17h
Visitação: até 15 de novembro, de terça a sexta, das 10h às 19h; sábado, das 10h às 20h; e domingo, das 10h às 18h
Quanto: Entrada franca
Informações: 51 4009. 2971 e www.ecarta.org.br
Projeto Territórios Negros

SOBRE OS PARTICIPANTES DE X:

Carlos Vergara possui uma obra extensa e consistente, que vem produzindo desde os anos 1960 e que lhe conferiu posição de destaque na arte contemporânea brasileira. Participou da 1ª Bienal do Mercosul, das 18ª e 20ª Bienais de São Paulo, da 39ª Bienal de Veneza e sua obra faz parte da coleção do Instituto Inhotim, do Museu de Arte Moderna de São Paulo, do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, entre outras importantes coleções.

Fernanda Oliveira é licenciada em História pela UFPel, mestre em História pela PUCRS e doutoranda pela UFRGS. Trabalha com associativismo negro a partir de fontes produzidas pelo grupo em uma interface com a compreensão do pós-abolição enquanto um período histórico que traz em seu eixo central a questão da liberdade e seus significados. Sua pesquisa está em diálogo estreito com os movimentos sociais, tendo em vista a ciência como uma forma de apresentar a outros públicos as dinâmicas, imposições e negociações exercidas pelos grupos negros enquanto parte da sociedade brasileira, uruguaia e diaspórica, em uma busca constante por uma autoria compartilhada. É assessora de clubes sociais negros e desenvolveu pesquisa para a construção de material didático por intermédio dos projetos “RS Negro” (secretaria de justiça do RS), “A África está em nós” (Editora Grafset), assim como do website “Outros Carnavais”, coordenado por Irene Santos.

Moisés Patrício é artista multimídia e arte-educador. Nasceu, em São Paulo, em 1984. Aos dez anos, inscreveu-se na oficina de pintura e grafite dos Meninos de Arte de Santo André. Durante o período da oficina, chegou a trabalhar como assistente do professor e a participar de várias exposições e eventos. Hoje, trabalha e vive como artista e educador em São Paulo. É membro-fundador do Atelier Coletivo DES (Dialéticas Sensoriais), que, desde 2006, realiza ações coletivas estéticas, produzindo exposições, instalações dialéticas sobre arte contemporânea e urbanidade nas periferias de Santo André e São Paulo.

Rafael RG nasceu em Guarulhos, em 1986. Vive e trabalha na cidade. Formado em Artes Visuais pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo (2010). Participou de mostras e festivais em cidades do Brasil e em outros países, como Argentina, México, Colômbia, Alemanha, Polônia, Espanha e Holanda. Recebeu, entre outros reconhecimentos, o 1º Prêmio Foco ArtRio, o Prêmio Honra ao Mérito Arte e Patrimônio/ IPHAN, o Prêmio aquisição do Centro Cultural São Paulo e, recentemente, foi agraciado com a Bolsa Iberê Camargo para residência no Künstlerhaus Bremen, na Alemanha. Em sua prática artística, costuma trazer duas fontes para construção de seus trabalhos: uma documental e outra afetiva, em geral por meio do uso de documentos garimpados em arquivos institucionais ou pessoais associados a narrativas que podem envolver sua pessoa ou um alter ego. A interação entre essas territorialidades resulta em obras que quase sempre se aproximam de uma ficção, ou de uma noção tensa de ficcionalidade.

SOBRE OS CURADORES

Leo Felipe é escritor e curador; mestre em Artes Visuais, pela UFGRS, com pesquisa que investiga o punk e a contracultura. Desde o início dos anos 1990, tem atuado na cidade de Porto Alegre nas áreas de música, jornalismo, literatura e artes visuais. É diretor artístico da Galeria de Arte da Fundação Ecarta e da web rádio Mínima FM, onde apresenta o programa Elefante. Tem dois livros de ficção publicados, AUTO (Ideas a Granel, 2004) e O Vampiro (Ideas a Granel, 2006), além do memoir A Fantástica Fábrica (Pubblicato, 2014). Participou da 9ª Bienal do Mercosul, como convidado do projeto Island Sessions, e do conselho curatorial da Casa M, projeto da 8ª Bienal. Integrou o conselho consultivo do MAC/RS (2013-2014). Há 12 anos é produtor e DJ residente da festa Pulp, que acontece mensalmente no Bar Ocidente.

Luisa Duarte, curadora independente e mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é crítica de arte do jornal O Globo e membro do conselho consultivo do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Coordenadora do ciclo de conferências “A Bienal de São Paulo e o Meio Artístico Brasileiro – Memória e Projeção”, plataforma de debates da 28a Bienal Internacional de São Paulo. Fez parte da comissão curatorial do programa Rumos Artes Visuais, Instituto Itaú Cultural (2005/ 2006). Organizou, com Adriano Pedrosa, o livro ABC – Arte Brasileira Contemporânea, publicado pela editora Cosac Naify em 2014.

Fonte: Jornalista Dóris Fialcoff