Continuei lendo embora achando absurda a proposta. Conforme a revista, fazer as unhas com a manicure poderia indicar ainda a mulher inserida no mercado de trabalho, com pouco tempo para tratar ela mesma das mãos. Na contramão do raciocínio estaria a mulher de negócios ou a perua que, após as compras no shopping, aproveita para fazer as mãos no salão de luxo, no próprio shopping.
Os homens não escaparam da tese em questão. A matéria citava como exemplo o chamado metrossexual – estereótipo do homem-modelo que cuida da aparência numa atitude quase religiosa de amarás a ti mesmo sobre todas as coisas. E ali estava a preocupação com as unhas. Cortes retilíneo-simétricos, cutículas etéreo-subtraídas serviriam de base para o brilho do homem atual, bem sucedido, sensível. Aqui em Pelotas não se vê essas frescuras.
Definitivamente cada vez mais me parecia não ter fundamento algum a tal leitura. Já pensou o homem da campanha fazendo as unhas? Lá pras bandas da fronteira, que se saiba, o gauchaço ainda corta as garras com facão. E a turma da cidade-grande? Sei não. Eu meto o calcanhar na beira da privada e mando ver com aquela maravilha da engenharia chamada de cortador-de-unhas. Mesmo em lugares públicos pode-se lançar mão do dito instrumento para dar uma aparada nas sobras. Domingo passado ainda vi um senhor de idade, perna dobrada e pé no banco da Praça podando as pontas amadeiradas dos cascos.
Difícil. Muito difícil acreditar na revista. Mas fez pensar no assunto. Até dei uma examinada nas mãos dos demais que esperavam o chamado médico. Ao menos o tempo ia passando mais rápido enquanto aguardava minha vez no consultório. Tinha unha de tudo que é jeito. Hoje em dia não tem padrão. Tem escritor que pinta unha. Vão dizer o que? Eu perguntei pra ele se era um alter ego ou seu lado feminino. Ficou doido: “tu tá louco, tchê?” Contou que era pra não lavar a louça em casa. Que aprendeu com a patroa. Enfim, que esperar de um ficcionista, senão uma resposta criativa?
“Próximo!” – O médico me chamou para o famigerado exame e, ao entrar na sala, não pude deixar de analisar suas mãos, unhas curtas e bem feitas. Menos mal, pensei.
*Márcio Ezequiel – Escritor.
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